A compreensão do comportamento eleitoral em democracias contemporâneas, especialmente em contextos de crescente polarização como o brasileiro, revela-se um imperativo analítico para a ciência política. Com um eleitorado robusto de 158.616.465 cidadãos, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Brasil oferece um campo fértil para a investigação das dinâmicas que subjazem à decisão nas urnas. O ato de votar transcende uma mera ação isolada, configurando-se como o epifenômeno de uma intrincada interação de fatores sociais, psicológicos e racionais, os quais são fluidos e contextualizados pelas vicissitudes políticas, econômicas e sociais de cada era.
As primeiras incursões teóricas na sociologia do voto, desenvolvidas entre as décadas de 1930 e 1940, preconizavam a posição social do eleitor como o vetor principal de seu comportamento eleitoral. Nessa perspectiva, o eleitor era concebido como um reflexo de seu grupo social de pertencimento – seja classe, religião ou outras categorias – e qualquer desvio desse padrão era interpretado como uma anomalia. Essa abordagem, embora seminal, progressivamente deu lugar a uma compreensão mais matizada do fenômeno eleitoral.
Com o advento da vertente psicossociológica, a análise do voto expandiu-se para incorporar elementos mais subjetivos e intrínsecos ao indivíduo. Fatores psicossociais como emoções, valores pessoais e identificação social passaram a ser reconhecidos como intervenientes diretos na decisão do eleitor. Essa transição teórica marcou um importante avanço, reconhecendo a agência individual e a complexidade das motivações subjacentes ao voto, para além das estritas determinações estruturais.
Paralelamente, a teoria da escolha racional emergiu como um modelo explicativo fundamental, concebendo o voto como um cálculo estratégico de custo-benefício. Nesta perspectiva, o eleitor, agindo como um ator racional, avalia pragmaticamente os potenciais ganhos e perdas associados a uma determinada escolha eleitoral, frequentemente ponderando o impacto direto em sua esfera econômica e pessoal.
No cenário brasileiro, a aplicação da teoria da escolha racional é perpassada pela variável da sofisticação política. Um maior nível de conhecimento político por parte do eleitor tende a mitigar a propensão a escolhas impulsivas ou excessivamente influenciadas por apelos emocionais. Contudo, a prevalência de um baixo nível de sofisticação política na maioria da população brasileira cria um terreno fértil para a ascensão de líderes populistas. Esses líderes, hábeis em comunicar-se diretamente com as massas por meio de discursos de confronto e dicotomias simplistas entre "nós" e os "inimigos do povo", exploram a dimensão simbólica do voto, onde a identificação pessoal e emocional com o candidato muitas vezes suplanta a análise aprofundada de plataformas ideológicas ou programáticas.
A compreensão da decisão do eleitor é ainda enriquecida pela distinção entre o voto retrospectivo e o voto prospectivo. O voto retrospectivo baseia-se na avaliação do desempenho passado do político ou partido, considerando as realizações e resultados já obtidos. Em contrapartida, o voto prospectivo é impulsionado pela esperança e pela expectativa em relação ao que o candidato poderá realizar no futuro, configurando-se como uma aposta em promessas e potenciais transformações.
Em síntese, o voto, em sua manifestação mais plena, é o produto de uma complexa intersecção entre a avaliação racional, as influências sociais e as motivações simbólicas. O eleitor não vota por uma única razão, mas por uma amálgama de fatores que se complementam: a crença na capacidade de um candidato em melhorar a vida individual ou coletiva – seja por meio de resultados concretos, promessas futuras ou pela simples identificação e representatividade que a figura política evoca.
Yuri Almeida é estrategista político, professor e especialista em marketing eleitoral.